O vírus tem conta bancária


Morgana Rio

Muitos dos profissionais de saúde estão trabalhando 48 horas sem parar. Bater palmas para eles não basta, tem que dar equipamento de segurança e melhores salários e uma garantia para as famílias desses profissionais, pois eles estão muito expostos a doença.

Acredito que o vírus tem conta bancaria. Eu sei que há um discurso nesse momento no Brasil de que o vírus não escolhe. O vírus mostra o quanto a desigualdade é gritante. Basta ver o número de mortos.

O rico tem bons planos de saúde, tem uma vida de certa forma mais saudável do que o pobre. O rico tem carro, melhores condições de moradia, se alimenta melhor e terá leito em hospital particular.

O pobre não. O pobre trabalha 44 horas semanais, leva mais de duas horas para ir e duas horas para voltar do trabalho. Não tem dinheiro para pagar nutricionista, personal trainer, vitaminas. Não tem qualidade de vida, não tem acompanhamento médico. O pobre tem muito mais risco.

Vou dar um exemplo do prefeito de minha cidade, no Brasil. Ele e rico, pegou corona e foi para um dos melhores hospitais do Rio de Janeiro, hospital particular. Ele teve leito, todo atendimento que precisa. Voltou para casa no seu carro blindado e tem enfermeira particular. O prefeito pode se isolar da família, pois mora numa mansão, ou pode ficar em qualquer uma de suas inúmeras casas.

Quem está na linha de frente dessa doença? Os enfermeiros, os funcionários de mercado, os frentistas, o pessoal da limpeza, esses que ocupam profissões que são ditas mais de pobres.

O médico também, mas pelo menos aqui, na Inglaterra, quem cuida é o enfermeiro. Lá no Tesco (rede de supermercados na Inglaterra), somos pobres, atendemos clientes. Não é o rico que está na linha de frente.

Temos que ter cuidado com esse discurso de que o vírus não escolhe classe social. É uma fala bem acentuada no brasil. Quem mais morre são minorias.

Aqui, as minorias também são as que morrem em maior proporção: pobre, negro, imigrantes. No Tesco, onde trabalho, nós – os imigrantes - estamos na linha de frente. Há 58% de chances de sermos contaminados pelo vírus por trabalhar com o público.

Já o gerente de área, branco, inglês e rico com um salário de 90 mil libras por ano, está trabalhando da casa dele. Esse vírus só mostra o que já sabemos: a desigualdade mata e muito.

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