Entre a espera e o movimento (Crônicas Além do Quintal n.14)

Airport Schipol - Amsterdam (Holanda)

Marcus Vinicius Batista

Em um mês, passei por cinco aeroportos diferentes, da escala de uma hora à espera de uma noite inteira. Num deles, foram quatro visitas, média de uma por semana, entre levar pessoas amadas, embarcar, desembarcar e ... esperar!

Os aeroportos são escolas sobre gente, que também nos ensinam sobre nós mesmos, com nossas limitações, esperanças, mesquinharias, desapegos materiais, sentimentos nobres e outros que poderíamos descartar como extravio de bagagem.

Aeroportos indicam como lição amostra grátis que esperar exige a convivência consigo mesmo. Uma hora a bateria do celular acaba ou os totens são lentos demais para a porcentagem que seu aparelho precisa para sair do coma induzido.

Para fugir da tentação, caio em outra bem mais saudável. Sempre levo um livro comigo. E o tamanho dele é de acordo com o tempo previsto de espera. A cada duas horas, café barato, de mesma qualidade daquele assalto vendido pela funcionária sorridente da franquia. Como leitura, escolho normalmente um bom romance policial. Funciona como entretenimento, remedia como literatura.

Aeroportos são fascinantes para ver gente. Ali, a diversidade é mais do que discurso, lei ou política pública. A diversidade está no tamanho das malas, na forma de carregá-las, na velocidade dos passos, na força dos abraços, na roupa que se veste, no idioma que se balbucia entre lágrimas na despedida ou no reencontro, no sorriso de quem atende, nas perguntas de quem controla quem entra e quem sai.

Observar as pessoas é o intervalo para descansar das pessoas que eu observava nas páginas de um livro. Gosto de ouvir as conversas, tentar descobrir o idioma delas, desvendar o que alguém está lendo, se estará no mesmo voo que eu ou chegará no mesmo avião que meus filhos ou minha esposa. Entre os corredores, os salões de embarque, os cafés e bancos, moram temporariamente pessoas exaustas, ansiosas, preocupadas, contentes, cheias de expectativas, histórias que me levam a especular sobre como seriam as biografias destes personagens. Em cada um, pílulas que reduzem a dor da minha espera.

Enquanto sonhamos com – ou tememos - o movimento que viveremos parados dentro de um avião, esperar é a moral da história de uma sociedade que (sobre)vive apressada. Gosto de aeroportos, só não pretendo esperar outra madrugada pelo ônibus das seis e meia da manhã. Meu corpo não aguenta. E não há romance que cure uma carcaça com 45 anos de uso.

Comentários

Jornal Vila Nova disse…
Ótimo texto Marcos. Gostei muito.