Iuri Cascaes*
Os últimos dias foram dias de pesquisa política. País em clima tenso, os tendões do pescoço da democracia todos doendo de esticados, palermas para cá, heróis para lá - um zilhão de discursos de dez dúzias de sujeitos engravatados filmados bem de perto. A TV mostra tudo isso. A internet mostra tudo isso. E eu, como não há escape de ficar com o ouvido inchado, me joguei de vez numa partezinha dessa gritaria, pra entender alguma coisa do que se passa na pólis brasileira.
Circundei os intuitos duns candidatos. Dentre eles, o primeiro tinha a cara inteira enrugada na direção de sua boca, a pele se arrastando em marcha seca para o orifício salgado; mal se via o rosto abrir; o cabelo parecia falso, os dentes se escondiam com vergonha, a roupa uma mortalha. Farejo um morto. Não sabia que Jair andava desse jeito tão acabado. Tão recrudescido. Tão múmia.
Fazia já um tempo que não via imagens ao vivo dele - ainda mais assim numa entrevista, em que sondam tão de perto. Vomitava areia atrás de areia uma mais cortante do que a outra, solucionava problemas antiquíssimos com a praticidade de um açougueiro. Jair é um maracujá de gaveta marinado no caldo da maldade.
Então algo clicou e compreendi: a cara e trejeitos do sujeito parecem adiantar o que ele quer. Dito e feito! O segundo candidato de que fui atrás era sincero e jovem, falava com a alegria de um menino travesso e com a força de um homem potente. Seu rosto era muito diferente: um nariz liso se encaixava ali no meio da cara sob arcos espertos de sobrancelhas astutas, pele lustra mas já madura da idade. Grandes mãos.
Então algo clicou e compreendi: a cara e trejeitos do sujeito parecem adiantar o que ele quer. Dito e feito! O segundo candidato de que fui atrás era sincero e jovem, falava com a alegria de um menino travesso e com a força de um homem potente. Seu rosto era muito diferente: um nariz liso se encaixava ali no meio da cara sob arcos espertos de sobrancelhas astutas, pele lustra mas já madura da idade. Grandes mãos.
A boca lançava sorrisos alegres e a língua afonemava verdades certeiras: lugar de tudo isso num corpo de 60 anos de idade. Não se encarcerava, não marchava, não se enfiava lábios adentro. O cabelo eram só paralamas que nada tinham de peruca.
Impossível não notar os movimentos de seus olhos vivos em cada silogismo: demolidores por si próprios, as palavras só faziam confirmar a captura da vitória fujona. Jair vociferava. Ciro comia solto na integridade.
De fato, de fato... Os intuitos se alastram pra dentro da pele e se mostram sem que nem percebamos!
De fato, de fato... Os intuitos se alastram pra dentro da pele e se mostram sem que nem percebamos!
* Crônica que nasceu do módulo Escritas do Cotidiano, dentro do Curso de Formação de Escritores, da Prefeitura de Santos.
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