A solidão de Juanna (Escritas do Cotidiano # 5)


Clara Sznifer*

Meio a centenas de crianças naquela grande gaiola, ela - acuada num canto - não larga a boneca de milho suja e esfarrapada. Quase não come e fala menos ainda.

Depois de ter sido separada da mãe e da avó, pela imigração americana, seu mundo desabou. Que lhe interessam os problemas dos refugiados? Que lhe interessam as dificuldades enfrentadas pela mãe em Xalapa?

Até ali, aos quatro anos, teve tudo que mais poderia almejar. Carinho dos irmãos sempre... Espaço para brincar também... Que maravilha todo aquele terreiro para correr atrás das galinhas e dos galos coloridos! O pai morrera quando ainda era recém nascida, mas não lhe faltou atenção dos tios e avós. A mãe, trabalhando na cidade como doméstica, custava a voltar, mas quando chegava, trazia coisas gostosas.

Naquele espaço reduzido, frio e gradeado, só tem de seu a boneca e um cobertor de alumínio. Olhos assustados, rosto sujo e nariz escorrendo, não deixa ninguém se aproximar. Outra criança maior procura contato, sensibilizada vendo aquela criança tão assustada, sem interagir com as outras. Aos poucos, tenta alimentá-la com uma sopa rala que trazem uma vez por dia. Quando consegue contato, ela só pergunta por Letizia, provavelmente a mãe.

Assim seguem os dias de Juanna, sem afeto, sem o colo quente da mãe e sem o dengo da vovó. Para ela, pouco importa se o mundo se solidariza com a sua mazela. Pouco importa quem é o culpado. Se o Trump vai mantê-la mais um dia ou um ano nesta situação.

Ela precisa de tão pouco para ser feliz. Não faz caso do lugar nem das condições. Apenas a mãe e a avó para tornarem, até mesmo aquele espaço frio e sinistro, num mundo mais benevolente para que o sonho possa voltar.

* Crônica produzida durante o módulo Escritas do Cotidiano, dentro do curso de Formação de Escritores, da Prefeitura de Santos.
  

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