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Na entrada do alojamento, em Vargem Alta |
Eliana Greco
Na manhã fria de um domingo, o ônibus saiu de Vila Velha para percorrer mais de 121 km até Vargem Alta, no Espírito Santo. Fui uma das primeiras a descer, pois estava fotografando tudo. As malas tomavam conta da calçada sem asfalto coberta de grama, diante do Centro de Convivência do Idoso. O portão de madeira azul, aberto, convida a entrar.
Amarelo, vou chamar o local assim, pois as paredes amarelas combinavam com nossos uniformes do Projeto Rondon. Um a um, entramos timidamente, olhando, carregando as malas uns dos outros, pegando os colchões e cobertores que previamente estavam arrumados num dos cômodos para nós.
A outra equipe, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, aos poucos se misturava com a nossa e não sabíamos que lá na frente nos tornaríamos grandes amigos.
À tarde, as duas equipes de alunos e professores pela primeira vez tomaram café juntos, um chimarrão compartilhado entre todos da roda formada no salão amarelo. Uma voz interrompe o silêncio toda vez que alguém pega na cuia: “Não se esqueça de tomar o chimarrão totalmente, fazendo a cuia roncar". Ainda escuto mentalmente essa voz típica e suave.
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O salão amarelo, base do Projeto Rondon |
Hora de dormir, hora de acordar, cada um pronto e ansioso para fazer a sua parte, deixar na cidade, nas comunidades o que a faculdade e o treinamento nos prepararam para essa operação Itapemirim.
Durante as semanas entre a névoa que caía todas as manhãs e as noites frias, desempenhamos o nosso mais amoroso papel: capacitar e deixar a semente. Confiança e credibilidade já criavam raízes entre moradores, professores, feirantes e funcionários do local.
As comunidades distantes, cercadas por enormes montanhas de mármore bruto e frio, eram os endereços de pessoas simples, esperançosas e com curiosidade de aprender.
Levei em minha mala, além de roupas e objetos pessoais, histórias para contar, e contei várias vezes até ficar sem voz. No olhar, nas caras e bocas ouvindo as histórias, escutando sobre um rei que sentia vergonha por nascer sem as orelhas, um menino que maltratava os animais, a linda joaninha que perdeu as pintinhas, percebi que ali também tinham pessoas que nasceram com algo que as incomodava muito. Meninos entre a platéia que faziam algo de ruim com animais, como na história da joaninha. Dei-me conta que meu melhor papel era esse: “falar sério brincando”.
Durante as semanas entre a névoa que caía todas as manhãs e as noites frias, desempenhamos o nosso mais amoroso papel: capacitar e deixar a semente. Confiança e credibilidade já criavam raízes entre moradores, professores, feirantes e funcionários do local.
As comunidades distantes, cercadas por enormes montanhas de mármore bruto e frio, eram os endereços de pessoas simples, esperançosas e com curiosidade de aprender.
Levei em minha mala, além de roupas e objetos pessoais, histórias para contar, e contei várias vezes até ficar sem voz. No olhar, nas caras e bocas ouvindo as histórias, escutando sobre um rei que sentia vergonha por nascer sem as orelhas, um menino que maltratava os animais, a linda joaninha que perdeu as pintinhas, percebi que ali também tinham pessoas que nasceram com algo que as incomodava muito. Meninos entre a platéia que faziam algo de ruim com animais, como na história da joaninha. Dei-me conta que meu melhor papel era esse: “falar sério brincando”.
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Eliana Greco, em Vargem Alta (ES) |
Sabia que teria que deixar tudo isso, mas dentro de mim algo ecoava que não estava ali por um acaso do destino. Não poderia partir sem ter a certeza do que foi dito, feito e indicado surtiria efeito lá na frente. Na tarde e noite do dia anterior, duas pessoas me disseram: “não vá embora, precisamos de você aqui, aprendi muito com as suas histórias”. Chorei.
Depois de 15 dias longe da família, é chegada a hora de partir, cada um em seu canto, arrumando as malas. Parei e, por alguns instantes, percebi que eu não só guardava minhas roupas e objetos, mas enchia minha mala de histórias de vida, histórias de anulação, histórias de esperança, histórias de discriminação e de violência infantil.
Rondon é assim mesmo: muitas vezes entregamos e levamos de volta o que imaginávamos buscar!
Depois de 15 dias longe da família, é chegada a hora de partir, cada um em seu canto, arrumando as malas. Parei e, por alguns instantes, percebi que eu não só guardava minhas roupas e objetos, mas enchia minha mala de histórias de vida, histórias de anulação, histórias de esperança, histórias de discriminação e de violência infantil.
Rondon é assim mesmo: muitas vezes entregamos e levamos de volta o que imaginávamos buscar!
Obs.: Este texto é fruto do curso "Crônicas: o amor pela vida cotidiana", dado por Marcus Vinicius Batista.
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