O supermercado de homens



Sempre acreditei que a seleção brasileira de futebol deveria ser a terra dos melhores, dos jogadores – no mínimo – excelentes. É claro que, nos últimos 15 anos, fiz vistas grossas para convocações estranhas de atletas que seriam vendidos, a toque de caixa, para mercados igualmente esquisitos. Jogadores que nunca mais seriam lembrados, inclusive pelo técnico que os convocou e – involuntariamente? – entrou na cadeia alimentar do negócio.

A seleção brasileira atual se assumiu como armazém de secos e molhados. Os critérios estão longe da transparência, as explicações do técnico Mano Menezes seguem paradoxais, atletas esquecidos ganham mais destaque do que os convocados e o time-base não existe na imaginação do mais patriótico torcedor.

O próprio coordenador de seleções, Andrés Sanchez, pediu que Mano parasse a fase de testes após quase 100 nomes chamados para treinar, viajar e talvez jogar, em partidas caça-níqueis contra Gabão e Bósnia, por exemplo. Até a partida contra Portugal, com vitória por 6 a 2, ganhou caráter duvidoso ao escancarar as portas do escândalo de empresas fantasmas e superfaturamento de dinheiro.

Mas pensemos na última convocação, para o amistoso contra a Bósnia, no final do mês. É evidente que todo técnico tem suas preferências e que sempre haverá um ou outro nome em discussão. Em 1990, Sebastião Lazaroni levou Tita – em final de carreira – e Bismarck, somente um bom jogador de clube. Por outro lado, Luiz Felipe Scolari provou que estava certo em não chamar Romário para a Copa do Mundo de 2002.

Parreira fez o contrário e acertou ao convocá-lo nove anos antes. Dunga também assinalou a alternativa correta quando demonstrou que Ganso, por enquanto, ainda é um atleta de clube.

A sensação que me incomoda é o fato de Mano Menezes, em suas listas, reiterar a entressafra que acomete o futebol nacional. As convocações estão recheadas de jogadores de melhores momentos da rodada, reservas de clube de grande expressão na Europa ou titulares de centros de segunda linha. Não é possível perceber quem são os titulares do meio-campo e do ataque.

Apenas o goleiro e a defesa mantém a regularidade, o que – de certa forma – simboliza a época das vacas magras, em um futebol onde é tradição sobrar opções entre meias e atacantes.

O volante Sandro aparece na última convocação. Ele jogou somente 75 minutos pelo Tottenham na atual temporada inglesa. O lateral Adriano, do Barcelona, é figurinha carimbada do grupo atual. Adriano atuou em apenas oito jogos da temporada espanhola.

Outra dúvida é a relação “afetiva” entre Mano Menezes e o Shaktar Donestk, da Ucrânia. Sempre aparecem atletas deste clube, sem tradição no cenário europeu, entre os convocados. Antes, o meia Jádson, hoje no São Paulo, e esquecido pelo técnico. O volante Fernandinho é o “queridinho” da vez. Será que não temos volantes melhores?

Entre os meias, Mano Menezes justificou a ausência de Kaká, afirmando que o meia do Real Madrid não o havia agradado nas últimas partidas. E Ronaldinho Gaúcho, que se arrasta no Flamengo? O técnico da seleção acompanhou os últimos jogos do meia, contra times pequenos da elite carioca?

Ganso, embora tenha arrebentado neste final de semana no Campeonato Paulista, apresentou irregularidades no início da temporada. O jogador do Santos terá mais uma oportunidade, ainda mais contra um adversário frágil, para ser goleado. A impressão é de que a justificativa ignora os vários pesos e medidas das listas.

Entre os atacantes, o Brasil não possui, no futebol europeu, jogadores melhores do que Jonas, do Valência? Hulk, do Porto, só conseguiu mostrar boa vontade. Até Robinho, que entra e sai do Milan, não estaria melhor do que ambos?

A quantidade de exemplos – que não sustenta a subjetividade das convocações – ganha reforço quando não se observa o planejamento que envolveria a seleção olímpica, a meses dos jogos em Londres. Não há uma equipe-base, e sim atletas chamados para compor o banco ou jogar alguns minutos diante de adversários de qualidade duvidosa.

Creio que seria mais produtivo que ficasse claro quem é a seleção olímpica e quem é a seleção principal. Convivência com colegas mais experientes em hotéis, aeroportos e vestiários não forma uma equipe entrosada e que pretende ser definitiva. Neymar e mais 10 é muito pouco para quem deseja uma medalha.

O modo de trabalhar do atual técnico, infelizmente, consolida a seleção brasileira como um balcão de negócios, que cultiva a imagem blasé diante da Copa do Mundo em casa. Uma postura de quem pode ganhar quando e aonde quiser. Numa fase de pouco frutos, a árvore pode apodrecer e tombar mais rápido do que se espera, e dentro do próprio quintal.

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