Reconstrução ou amostra grátis?


Rafael; Pará, Edu Dracena, Durval e Léo; Arouca, Ibson, Elano e Paulo Henrique Ganso; Neymar e Borges. No papel, talvez seja o melhor time brasileiro da atualidade. Esta equipe estréia hoje, contra o Flamengo, na Vila Belmiro. Eles nunca jogaram juntos e compõem o que o Santos possui de melhor, no momento, para se recuperar no Campeonato Brasileiro e sonhar em medir forças contra a melhor equipe do planeta, no final do ano, no Mundial Interclubes.

O Santos de hoje pode não ser o clube de amanhã. A amostra, por enquanto, é grátis porque o time inicia um processo de reconstrução. Vários atletas coadjuvantes saíram; outros foram contratados. O assédio permanece latente sobre as principais estrelas da equipe.


Da forma como o futebol é conduzido no país, precisamos nos acostumar com a desmontagem de times vencedores. Assistimos apenas às fagulhas de sucessivas histórias de amor, desfeitas com a fugacidade de um namoro de verão. Um semestre é o limite para o sonho do torcedor.

Ganso e Neymar, por exemplo, recebem, pela imprensa, propostas milionárias quase todos os dias, das quais somos incapazes de distinguir se representam uma despedida em breve ou mais uma cortina de fumaça para (re)valorizar jogador. Os atletas brasileiros seguem atraentes, mas encareceram, enquanto as atuações na seleção não condizem – em proporção – aos caminhões de dólares exigidos no Brasil. Pode ser a saída, ainda que frágil, para prendê-los mais um pouco por aqui.

Esqueçamos um pouquinho os esquemas empresariais e pensemos nos 11 que defenderão o Santos na maratona de jogos pelo campeonato nacional. Mais do que isso, nas palavras do técnico Muricy Ramalho, o Santos está sem time. A história do campeonato nacional, no modelo pontos corridos, indica duas características básicas para se posicionar entre os quatro primeiros.

A primeira dela é manter a comissão técnica durante toda a competição. Comissão técnica, porque a equipe de profissionais é quem mantém o barco no rumo. Os treinadores, à beira do campo com seus sinais e gritos, são supervalorizados no papel que exercem. Palavras de gente como Tostão e o próprio Muricy.

A comissão técnica, com tranqüilidade para cumprir suas obrigações, consegue traçar e executar, na maioria das vezes, objetivos de longo prazo. Dentro e fora de campo. Antes, durante e depois das partidas.

Mas a primeira característica depende, como uma injeção diária ministrada a um doente crônico, do segundo ponto: o elenco. O Campeonato Brasileiro obriga os principais clubes a manterem times com 22 jogadores para as 38 partidas. 22 jogadores em condições de decidir, não garotos que completam treino ou atletas de qualidade duvidosa. Contusões, suspensões, o desgaste natural da temporada, além das convocações para as seleções principal e de base, representam elementos que desmontam uma equipe ao longo do torneio.


O técnico Muricy Ramalho reclamou inúmeras vezes que não possui este grupo. Vencedor de quatro campeonatos nos últimos cinco anos, ele sabe como ninguém que reservas à altura (a receita aponta evitar medalhões!) são meio caminho andado para figurar entre os melhores. São Paulo, por três vezes, e Fluminense, ambos sob comando dele, confirmam a tese.

Hoje, o Santos possui somente 11 titulares e dois ou três reservas com capacidade de resposta imediata em uma partida. Os demais são meninos crus, recém-promovidos ao time de cima, e novidades de segunda linha sem grandes chances de uma sequência de jogos.

Neymar e Ganso, salvo o adeus para a Europa, serão convocados com freqüência para a seleção brasileira. A ausência dos dois – e eventualmente Elano – abala a espinha dorsal. Faz do Santos um time como os demais. A classificação no campeonato, mais a escassez de gols (nove em oito partidas), selam o argumento da instabilidade.

A Vila Belmiro estará lotada para ver a estréia do Santos idealizado. Pena que não há garantias de que a amostra grátis será um remédio definitivo para a mesmice do futebol nacional. Um grande time precisa de tempo para se desenvolver. A gestação é naturalmente instável e dolorosa.

Este Santos pode morrer antes de sair do ovo, o que me dá a impressão de que veremos o trailer de um filme candidato ao Oscar, mas sem acesso a ele nas salas de cinema.  

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