Sem reino e sem súditos


Dois atacantes retornaram ao Brasil e confirmaram o óbvio. Ex-atletas de seleção brasileira – alguns são ex, mesmo convocados eventualmente - fingem voltar às origens, recebem as honras do bom filho, tem a vida pregressa enterrada, enquanto tentam sobreviver diante da última porta aberta para exercer a profissão. 

Luis Fabiano retornou ao São Paulo. Deverá ter sucesso por aqui, mas há de se lembrar que jamais foi um atleta de ponta no universo europeu. Jogou em equipes médias e, no máximo, foi paquerado por times grandes. Foi o centroavante do técnico Dunga e ocupou uma vaga ainda não preenchida.


O outro representante dos “retornados” é quem me interessa mais. Adriano vai jogar pelo Corinthians em dois meses, quando começar o Campeonato Brasileiro. Será? Dois meses é tempo demais para uma carreira que perdeu o eixo a partir de 2008. O clube está ciente da condição e da fama do jogador e preparou um contrato de risco e por produtividade, embora a direção mantivesse a pose de pavão na festa de apresentação do atacante.

Adriano é um daqueles personagens que poderiam ter sido muito mais. Poderia ter sido o sucessor de Ronaldo, mas talvez tenha sido superestimado. Adriano é um atacante de força, dependente da condição física, o que exige uma vida quase espartana. O jogador rumou para o ponto oposto. Naturalmente, perdeu rendimento e sucessivos empregos.

O Corinthians, ao utilizar Ronaldo para servir de anfitrião do Imperador, tenta acertar dois alvos com um cheque apenas. A direção do clube é a dona do cassino, onde tem tudo a ganhar e, mesmo se perder dinheiro, poderá se colocar na condição de mais uma vítima da instabilidade do jogador. Ser vítima é sempre mais confortável. 


Com esta decisão, o clube busca também clarear a imagem de Ronaldo, manchada pela derrota na Libertadores e pela aposentadoria antecipada, e recuperar a de Adriano, que poderá ser eleito o pior estrangeiro da temporada italiana. Nove jogos pela Roma e jejum de gols. Quase demissão por justa causa.  

As chances de a estratégia dar certo são grandes. Ronaldo terá também uma festa de despedida e o time melhorou depois da eliminação para o Tolima. Se vencer o Campeonato Paulista, o Corinthians amenizará o grau de responsabilidade do ex-jogador. No caso de Adriano, jogar no Brasil é bem mais tranqüilo do que atuar nos principais centros da Europa.

Apesar dos ufanistas praticarem o auto-engano (ou a bajulação, no caso dos jornalistas de arquibancada) quando afirmam que o campeonato nacional é o mais difícil do mundo, esquecem-se de que ainda somos um mercado periférico e que a seleção brasileira continua estruturada a partir do que temos de melhor no Velho Continente. O raciocínio dos patriotas tem lógica, mas pelas razões erradas. O equilíbrio acontece porque o baixo nível é generalizado. 


Adriano é desnecessário para o Corinthians. Liédson resolveu os problemas do ataque e a própria aposentadoria de Ronaldo rearranjou o modo de jogar da equipe. Liédson toparia ser coadjuvante do novo companheiro? E vice-versa?

Adriano ficaria no banco de reservas, caso Jorge Henrique e Dentinho tivessem melhor rendimento? Ou abandonaria o clube no meio do contrato? Para bom entendedor, as meias palavras recentes indicam que Adriano vai jogar, inclusive em condições duvidosas.

Por que o jogador não ficou mais de seis meses no São Paulo? Por que não suportou jogar mais do que uma temporada no Flamengo? Aliás, por que não retornou à casa onde nasceu?

Quando um jogador gera mais dúvidas do que certezas, o futuro não se desenha com linhas fortes. A instabilidade dele ajuda a entender porque seu contrato com o Corinthians expira no final do próximo ano.

Ninguém (torcida, dirigentes, imprensa) confia no atacante, mas tem esperanças de contar com lampejos do imperador no restante da temporada. Parece-me pouco – para ambos os lados – em se tratando de alguém que recebeu um título imperial da Internazionale, de Milão.


O que me entristece é ver alguém talentoso afogar seu dom no próximo copo de cerveja, na próxima noitada, nas ameaças de quem se julga incompreendido. Adriano poderia ter sido o centroavante do Brasil no último Mundial. Tinha, nos pés, a capacidade de estraçalhar defesas, sem olhar a cor da camisa.

Serviu de coadjuvante em 2006, como preparação para arrebentar no Mundial seguinte. Hoje, não integra a mais otimista das listas de convocáveis. Sequer foi disputado à tapa quando anunciou o retorno ao Brasil.

O Corinthians resolveu dar mais uma chance ao ex-imperador. Aos 30 anos, Adriano deve saber que os convites, a partir de agora, começam a ficar mais raros. Se jogar o Corinthians no lixo, restarão as lembranças de quem teve a coroa e o cetro nas mãos. E a certeza de que o clube contratou, além do imperador deposto, um ex-jogador. 

Comentários

Cahe´s blog disse…
Não vejo o Adriano sentado comportadamente no banco, como vemos o Rivaldo no São Paulo.
A certeza que tenho é que os rivais do Corinthians perderam um reforço quando o Ronaldo se aposentou e ganharam outro com a volta do Adriano.
É muito mais fácil ele gerar notícias que gols.

Carlos Freire, um Palmeirense.
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