Por Elizabeth Soares
Certa noite, um lobo veio me visitar. Chegou em silêncio. Escolheu o esconderijo com cautela e frieza. Invadiu meu espaço mais íntimo. Foi cruel. Cometi um erro comum aos que se julgam imbatíveis: subestimei-o.
Quando despertei, ele havia tomado meu sangue. Trouxe-me dor, sofrimento e me aproximou dos meus próprios limites. Desfigurou minha forma. Arrancou meus cabelos. Roubou minha identidade e o espelho passou a refletir uma imagem distante de mim.

Olhei-o com olhos de medo. Depois, com raiva. Mas nem o medo nem a raiva fizeram o lobo ceder. Ao contrário, ele avançou, porque seu alimento eram as minhas fraquezas. Percebi que nunca conseguiria expulsá-lo.
Surpreendentemente, a dor me fez enxergar meu algoz de um jeito diferente. Quando pensei estar mais frágil, estava na verdade mais forte. Entendi que o lobo representava o freio de meus impulsos mais primitivos. E isto inclui a própria raiva e o próprio medo. Encarei-o com outros olhos. De aceitação.
Agora, eu e o lobo somos quase amigos. De vez em quando, por piedade ou pura preguiça, ele se aquieta e dorme. E se mantém assim por muito tempo. Tem sido desta maneira há dez anos. Neste período, ele já acordou, com toda a sua fúria, por cinco vezes. Em uma delas, oprimiu meu coração até quase fazê-lo parar. Queria que eu silenciasse para escutar o quanto o ressentimento pode calar o amor. Por sorte, entendi a tempo.
Na última vez que despertou, há aproximadamente dois meses, o lobo feriu com seus dentes afiados minhas pernas e deixou pequenas, mas dolorosas marcas. Sinceramente, fiquei triste. Achei que tínhamos nos entendido.
O lobo me disse que voltou porque queria me lembrar que eu não precisava fugir do desconhecido. Não estou só, ao contrário do que sinto quando passa pela minha cabeça me atirar do alto do meu próprio ego. Disse que a solidão é apenas uma impressão, não minha essência.
Ele também queria me dizer que eu precisava reduzir o passo, ir com calma, admirar a paisagem. Olhar para a vida e para as pessoas com mais tolerância e paciência, compreendendo que cada um só pode doar aquilo que tem e, mesmo para doar, precisa encontrar o tempo certo. E, seja qual for meu desejo, cada um tem seu próprio tempo. Eu, (in)felizmente, teria que respeitar isso.
Mais uma vez o lobo me salvou. Desta vez do ilusório controle permanente da vida. O nome disso – e é preciso deixar de lado o eufemismo que habitualmente usamos para definir nossos defeitos - é prepotência. Um engano que me fez acreditar que tomar as rédeas dos acontecimentos era a única receita para ver meus planos e sonhos concretizados.
Ao contrário do que eu pensava, meus planos e sonhos só se concretizam porque vivo cada dia aproveitando os momentos, assimilando as lições, me relacionado com pessoas que admiro, respeito, amo e me apaixono.
No fundo, desde o início, o lobo sempre tentou me dizer “Ei, mocinha, presta atenção na vida. Ao contrário do que diz seu nariz empinado, você não é imortal. E você precisa alegrar-se por isso”.
Mais cedo ou mais tarde, terei que reconhecer: ele sempre esteve certo.
Ilustração: Kitty Yoshioka
Certa noite, um lobo veio me visitar. Chegou em silêncio. Escolheu o esconderijo com cautela e frieza. Invadiu meu espaço mais íntimo. Foi cruel. Cometi um erro comum aos que se julgam imbatíveis: subestimei-o.
Quando despertei, ele havia tomado meu sangue. Trouxe-me dor, sofrimento e me aproximou dos meus próprios limites. Desfigurou minha forma. Arrancou meus cabelos. Roubou minha identidade e o espelho passou a refletir uma imagem distante de mim.

Olhei-o com olhos de medo. Depois, com raiva. Mas nem o medo nem a raiva fizeram o lobo ceder. Ao contrário, ele avançou, porque seu alimento eram as minhas fraquezas. Percebi que nunca conseguiria expulsá-lo.
Surpreendentemente, a dor me fez enxergar meu algoz de um jeito diferente. Quando pensei estar mais frágil, estava na verdade mais forte. Entendi que o lobo representava o freio de meus impulsos mais primitivos. E isto inclui a própria raiva e o próprio medo. Encarei-o com outros olhos. De aceitação.
Agora, eu e o lobo somos quase amigos. De vez em quando, por piedade ou pura preguiça, ele se aquieta e dorme. E se mantém assim por muito tempo. Tem sido desta maneira há dez anos. Neste período, ele já acordou, com toda a sua fúria, por cinco vezes. Em uma delas, oprimiu meu coração até quase fazê-lo parar. Queria que eu silenciasse para escutar o quanto o ressentimento pode calar o amor. Por sorte, entendi a tempo.
Na última vez que despertou, há aproximadamente dois meses, o lobo feriu com seus dentes afiados minhas pernas e deixou pequenas, mas dolorosas marcas. Sinceramente, fiquei triste. Achei que tínhamos nos entendido.
O lobo me disse que voltou porque queria me lembrar que eu não precisava fugir do desconhecido. Não estou só, ao contrário do que sinto quando passa pela minha cabeça me atirar do alto do meu próprio ego. Disse que a solidão é apenas uma impressão, não minha essência.
Ele também queria me dizer que eu precisava reduzir o passo, ir com calma, admirar a paisagem. Olhar para a vida e para as pessoas com mais tolerância e paciência, compreendendo que cada um só pode doar aquilo que tem e, mesmo para doar, precisa encontrar o tempo certo. E, seja qual for meu desejo, cada um tem seu próprio tempo. Eu, (in)felizmente, teria que respeitar isso.
Mais uma vez o lobo me salvou. Desta vez do ilusório controle permanente da vida. O nome disso – e é preciso deixar de lado o eufemismo que habitualmente usamos para definir nossos defeitos - é prepotência. Um engano que me fez acreditar que tomar as rédeas dos acontecimentos era a única receita para ver meus planos e sonhos concretizados.
Ao contrário do que eu pensava, meus planos e sonhos só se concretizam porque vivo cada dia aproveitando os momentos, assimilando as lições, me relacionado com pessoas que admiro, respeito, amo e me apaixono.
No fundo, desde o início, o lobo sempre tentou me dizer “Ei, mocinha, presta atenção na vida. Ao contrário do que diz seu nariz empinado, você não é imortal. E você precisa alegrar-se por isso”.
Mais cedo ou mais tarde, terei que reconhecer: ele sempre esteve certo.
Ilustração: Kitty Yoshioka
Comentários
Conta comigo. Amo vc, saudades.
Cristina Frias
Texto maravilhos! E quem não se identifica com ele???
Me lembro de vc menina timida e quieta, e como foi lindo observar o desabrochar desta mulher!!!!
Tornou uma linda mulher, literalmente, em todos os sentidos.
Tenho voce no meu coração como se fosse minha filha, sinto orgulho de cada conquista sua.
É isso mesmo, o nosso "lobo" nos ensina e mostra, que sermos fortes, é podermos ser fracos as vezes....
Ter a consciencia que ele existe mas não precisa nos ferir é o segredo da felicidade, pra mim.
Lembre-se que não existe somente este lobo feroz, ai "mocinha", mas existe um lobo bom, que conquista, que não se deixa abater, que confia e vai sempre em frente, melhor alimentar este.
O outro deixa quieto...rsrs
bjks, te amo
Sua inteligência e sensibilidade fazem de você essa pessoa admirada por todos que te amam.
Tenho orgulho de ser sua amiga. Parabéns! Amo você!
Beijos no coração,
Jéssica
Dá orgulho ver um texto desse e saber que eu conheço quem escreveu. Como eu já te falei, vou sentar mais perto de você, quem sabe consigo captar um pouco desse dom por osmose! =)
Parabéns pelo texto maravilhoso e que, como dito em um dos comentários, faz com que as pessoas se identifiquem com ele!
Adoro você, eterna boss!
Beijos,
Joanna x)
Vocês não imaginam como foram importantes para mim, não só neste momento, com as palavras, mas ao longo da minha trajetória, junto ao lobo.
Sou muito grata por tudo!
Um grande beijo!
Demorei prá comentar justamente pela delicadeza que o assunto traz, e por não querer ofender tantos lobos soltos por aí. O seu primogênito, e o meu caçula. Peço todos os dias que essa irmandade não cresça! rs
O lobo é aprendizado, é crescimento, é poder olhar e se gostar.
Um algoz tão temido acaba tornando-se o companheiro de toda uma existência.
Eles são nossos propósitos, caminhos e um dia, seguirão sozinhos sem mais precisar nos atacar.
O lobo é nosso protetor, uma força que nos preserva de nós mesmas. Um alerta consciente.
Beijos no seu coração,
Aline.
Vc, tanto quanto eu, sabe exatamente como é viver com esse lobo. E sei que ter alguém com seu nível de sensibilidade, inteligência e sinceridade na minha vida é um dos maiores presentes que a vida me deu. Melhor ainda é saber que o lobo, felizmente, é apenas uma das nossas similaridades e singularidades. Obrigada por estar presente, sempre, na minha vida.
Beijos!
Como é bom ter pessoas como vc por perto. Tenho certeza que poderei contar sempre com sua sensatez, amabilidade e carinho, tanto nas horas difíceis como nos momentos de alegria!
Obrigada por mais essa prova de amizade, traduzida em suas palavras, tão carregadas de emoção. Me levaram às lágrimas.
Um beijo, amiga!
Lindas e sábias palavras que expressam claramente a convivência com este lobo. Tenho alguém que amo mto, tão forte qto vc, que vive com um lobo como este...
Bjks no s2!