Universidade ou shopping center?

Este texto foi publicado há oito anos, na extinta revista eletrônica O Caiçara. Relendo depois deste tempo, percebi o quanto é atual, salvo apenas os nomes do personagens envolvidos.

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O Brasil nunca teve tanta gente estudando! O Ministério da Educação dá pulos de alegria e tem pressa em divulgar seus índices. Mais de 90% das crianças frequentando o ensino fundamental. Cerca de 13 milhões de estudantes matriculados no ensino médio. E mais de 2,5 milhões de universitários nos bancos escolares (hoje é o dobro!). Números que, à princípio, assustam e nos transmitem a sensação de que a educação brasileira segue o rumo correto.

Faço minhas as palavras do (então) presidente da República, Fernando Henrique Cardoso: "A educação brasileira cresceu em quantidade, mas ainda falta qualidade."

Os números realmente são relativos. No caso dos sistemas de ensino fundamental e médio, as estatísticas mostram que o desempenho dos estudantes é inferior a 1995, quando o Governo Federal - com apoio de Estados e Municípios - entrou de cabeça em campanhas para levar todas as crianças à escola. A queda de desempenho atinge todas as disciplinas envolvidas: português, matemática e ciências (biologia para o ensino médio); atinge tanto as escolas públicas e privadas; atinge Estados ricos como São Paulo e Rio Grande do Sul e Estados pobres como Acre e Alagoas. As exceções ficam por conta do Rio de Janeiro e de Roraima.

Para a (então) secretária de Educação de São Paulo, Rose Neubauer, os dados refletem o grande número de crianças pobres que tiveram acesso às salas de aula. Como se elas tivessem obrigação de estarem prontas para estudar! Sem falar no preconceito de classe.

No entanto, não pretendo me estender muito em análises sobre o ensino fundamental e médio, pois pretendo enfocar a universidade brasileira nesse artigo. São 5 milhões de universitários (índice atual). E daí? Em números proporcionais, temos a metade do corpo discente das universidades dos Estados Unidos. O provão - mecanismo de avaliação criado pelo Ministério da Educação - indica que a maioria das universidades brasileiras oferece um ensino regular ou ruim. (O atual ENADE não alterou a configuração).

Sabe quantas faculdades foram fechadas por causa da má qualidade de ensino, conforme prometeu o (então) ministro Paulo Renato de Souza? Nenhuma. (O tabu permanece no governo Lula) Não é surpreendente, pois muitos integrantes do Conselho Nacional de Educação, órgão fiscalizador das universidades, trabalham nessas instituições.

O Ministério da Educação não fornece quaisquer sinais de que vai mudar a situação. Antes do governo FHC, havia cerca de 500 faculdades e universidades no Brasil. Hoje, o número é três vezes maior.(Hoje, quase cinco vezes mais. Lula manteve o ritmo de criação de cursos)

Ao invés de fechar as faculdades de esquina, o Ministério autoriza mais e mais aberturas de instituições de ensino superior. Muitas delas administradas por pessoas com ligações diretas ou indiretas com o Ministério. A promiscuidade da relação chega ao ponto de notas serem descaradamente alteradas em reavaliações duvidosas. Como o caso de uma faculdade de medicina de Minas Gerais, que teve autorização para se adequar às normas por mais dois anos, quando são indicadas duas saídas: prazo de seis meses ou fechamento.

A consequência começa a emergir. O excesso de faculdades criou um clima de competição para atrair o estudante. O que seria ótimo se não fossem as armas adotadas. Em São Paulo, por exemplo, universidades como a Nove de Julho e a Bandeirante investiram em praças de alimentação, lojas de griffe e outros badulaques para chamar a atenção dos clientes, ou melhor, dos alunos.

Os próprios estudantes já desconfiam dos investimentos, conforme apontou reportagem de O Estado de São Paulo. Será que o dinheiro também está sendo empregado em qualificação do corpo docente, reforma e construção de laboratórios, ampliação de bibliotecas? Os resultados nas avaliações do Ministério não são animadores.

O Ministério da Educação precisa avaliar essas estratégias que enchem as salas de alunos, que os distraem durante os intervalos e que depois os dão a sensação de que estudar é SOMENTE um grande passeio, uma grande diversão. É preciso cobrar qualidade, pois esses estudantes serão enviados quatro, cinco anos depois para o mercado de trabalho que, aliás, já está atento a isso. Não é à toa que grandes empresas implantaram programas de treinamento, visando adequar os alunos ao mercado. Ação complicada, do ponto de vista ideológico.

Caso contrário, é melhor que os universitários assistam às suas aulas no shopping center, pois o cenário será o mesmo, com a diferença que serão somente consumidores, e jamais cidadãos.

Comentários

Daniel. disse…
O Governo Tucano no Estado de São Paulo, passava diversos alunos de ano sem ter condições, arrumava diversas maneiras de fazê-los serem aprovados. E quem fiscalizava isso? Afinal, Fernando Henrique Cardoso era o Presidente da Republica na época e, era T u c a n o.

Eu fui uma das vítimas da Escola Estadual. Tive sérios problemas psicologicos no Primeiro colegial - este o mais importante, devido ser base fundamental para o segund e o tercerio - e o aconteceu? Me A P R O V A R A M.. Pasme! Eu reconheço ter merecido aquela repetencia, praticamente pedi para isso acontecer devido a saber que isso me afetaria no futuro... E AFETOU.

Gastei dinheiro fazendo cursinho para recuperar parte daquilo.

Governo TUCANO E SUAS ESCOLINHAS DE VERÃO (NEM SE QUER FUI PRA ELAS)

OU SEJA... Ñ É SÓ LULA!!

Hoje faço faculdade, e dou meritos aos meus esforços... Mas acredito que essa mania de "Faculdade" para tudo, vai acabar com a educação no BRASIL. Nem td é necessário faculdade, mas para o BRASIL é... Olhar para os grandes CENTROS mundiais podemos ver que isso não é tão necessário assim e eles nmem se preocupo com isso assim.

Daqui a pouco veremos.. "Faculdade de Coleta Seletiva."; "UNIGARISP" uNIVERSIDADE DOS GARI DO ESTADO DE SÃO PAULO....

NÃO DÚVIDO DE NADA
SEM DESMERECER ESSA PROFISSÃO.. PQ ESTES MERECERIAM UMA FORTUNA PARA TRABALHAR E FAZER O QUE FAZEM.
Andre Argolo disse…
Marcão, pude dar uma boa passeada pelo blog nesses dias sem trabalho. Percebi o quanto perco quando não o faço no dia-a-dia. E o que mais gostei é que pra você não há dia sem trabalho, talvez porque a história tampouco sai de férias, né? A gente tende a falar do trabalho como algo ruim e a encarar folga como o céu... bobagem. É admirável a força dos seus textos e a determinação de escrever sempre, jornalista-historiador, tudo junto, cidadão de primeira, pelo exercício da expressão. Não nos falamos faz tempo. Deixo um grande abraço, com admiração. Andre Argolo/.
Andre, quanto tempo, hein?? Muito obrigado pelas palavras generosas. Visitei o site da ESPN. Aguardo retorno por e-mail. Grande abraço!!!