Maldita cartilha!

Artigo publicado no Jornal Metrópole (Baixada Santista), edição n.163, em 19 de julho de 2008.

Com a definição da corrida eleitoral, Santos escapou – em tese – de um plebiscito para a Prefeitura. Efetivamente, a eleição para a maior cidade da Baixada traz apenas duas novidades. A primeira se refere à presença da ex-prefeita Telma de Souza como candidata à vereadora. Pela reação dos parlamentares, a candidatura sacudiu a Câmara Municipal. Muitos vereadores de carreira aceleraram o ritmo de trabalho, pois sabem que Telma deverá provocar aumento da bancada do PT.

A outra mudança é que Santos adotou o jeito vicentino de se fazer política-eleitoral. Isso significa o embarque numeroso de partidos na coligação do candidato da situação e favorito para a vitória. São 17 partidos em torno do prefeito João Paulo Tavares Papa. Nada ilegal, porém imoral para a pluralidade do processo democrático, que consistiria em diversos projetos para a cidade.

A disputa para o Poder Executivo ainda é pouco atraente. Não há candidatos que possam surpreender o eleitor, nem pelo exotismo ou pela postura ideológica (hoje, um artigo museológico). Papa nada em águas calmas, com popularidade alta e presença constante na mídia (o que inclui certo exagero de veículos tradicionalmente servis).

Entre as análises apresentadas, a principal expõe que a presença da ex-deputada federal Mariângela Duarte seria benéfica para o prefeito. As duas mulheres brigariam por fatias parecidas de eleitorado, o que facilitaria uma vitória de Papa no primeiro turno. Se ocorrer, é uma crueldade com o processo político. Segundo turno é salutar para a democracia para se estabelecer balizas ideológicas, em tese, e para permitir uma exposição mais nítida dos programas de governo, de como se planeja a cidade para os próximos quatro anos.

A coligação, liderada pelo PMDB de Papa, significa a construção de uma casta política interessada nas benesses do poder. Há, inclusive, partidos tradicionais, como o PSDB, capaz de produzir candidato próprio, mas que se mostrou tímido na renovação das fileiras, pois produziu novas lideranças legislativas, mas implodiu na construção de um candidato para o Poder Executivo.

A situação da política santista é o mais claro exemplo da cartilha eleitoral publicada há dois meses pelo prefeito do Rio de Janeiro, César Maia. Com 31 itens, a cartilha ensina como o candidato deve nortear suas ações para vencer uma eleição. Entre as pérolas, a idéia de que o eleitor crê em confiança, pois possui uma visão tanto distorcida de honestidade.

Os ensinamentos envolvem também evitar a vulgaridade nos ataques aos adversários e como esvaziar o conteúdo ideológico do processo eleitoral. Em outras palavras, o mais óbvio mandamento dos marqueteiros: encarar o eleitor como consumidor e moldar a candidatura conforme os desejos daqueles que poderiam engolir um produto bem embalado. Uma das lições do kit-Maia indica, por exemplo, que o candidato deve partir do centro e rumar conforme as indicações da maré.

Nada mais pragmático e ilusório! A cartilha de Maia é pontual, mas um escândalo em termos de moralidade. Parece que ele olha para a eleição em Santos. Na verdade, Sucupira nunca esteve morta na política brasileira. Facetas da democracia!

Comentários

Michel Carvalho disse…
Ótimo texto Marcão, mas o caso mais escandaloso desse "pragmatismo" eleitoral é o da cidade de São Vicente em que os vereadores se perpetuam na Câmara e uma infinidade de partidos apóiam o prefeito. Fora isso, tem o deputado e ex-prefeito lançando seu próprio filho, que mal tirou a habilitação, para vereador ancorado por uma ONG criada em meados de abril deste ano, num caso de casuísmo e cara-de-pau inédito! São Vicente lembra um pouco a Bahia dos ACMs. Lamentável!!!!
Michel,obrigado pelo comentário!!! É a promiscuidade da política brasileira. E muitos acham que o coronelismo é prática exclusiva nas cidades do interior, em regiões paupérrimas!! São as dinastias de um país cartorial. Grande abraço!