A mulher que nunca viu Adriana Esteves


Mariana é a atriz de gorro, na estreia da peça "A Terra
pode ser chamada de chão" (Foto: Rafaella Martinez)

Marcus Vinicius Batista

Mariana Salgado, de 25 anos, é uma das funcionárias do projeto Tam Tam. Ela faz parte do grupo há dez anos. Cuida da parte administrativa, organiza o bar e fica na bilheteria em dia de balada, quando também atua. 

Mariana decidiu ser atriz aos 12 anos. Ela poderia dizer que se aproximou do teatro para ser uma celebridade, por razões políticas ou pelo desejo de mudar o mundo. Mas a resposta é direta: “Queria conhecer a Adriana Esteves.” 


Em 25 de fevereiro de 2003, aos 14 anos, escreveu uma carta para a atriz carioca. O texto foi registrado em uma folha de papelão, mas Mariana preferiu não colocá-lo no correio. A paixão, que começou quando Adriana Esteves trabalhou na novela “Coração de Estudante”, levou Mariana a tatuar no braço o nome da atriz. Na verdade, tatuagens provisórias, feitas com ponta de compasso e preenchidas com tinta de caneta. 

Nesta época, ela pediu ao pai que a matriculasse em um curso de teatro. A primeira tentativa, no Senac, deu errado. A turma não abriu por falta de alunos. Conseguiu a matrícula na
Escola Livre de Artes Cênicas, que funcionava numa casa na rua Julio Conceição, na Vila Mathias, em Santos. Lá, ouviu falar do Café Teatro Rolidei.

Mariana passou a frequentar todas as baladas, às sextas e aos sábados. Mesmo quando começou a trabalhar como voluntária no café, preferia ser público. “Passava a noite toda dançando. Chegava lá à tarde, arrumava o café, voltava para minha casa, tomava banho, me arrumava e retornava para o café, onde ainda pagava entrada. Gosto de ser público.” 

Estudar e respirar teatro não mudaram o sonho dela. Aliás, houve uma adaptação. “Sonhei que ela entrava no Rolidei comigo.” O primeiro trabalho no Café Teatro Rolidei foi uma sátira à novela “Alma Gêmea”. Renato di Renzo, impressionado com a devoção da atriz iniciante, escreveu um esquete chamado “Alma que geme”. 

Decoração do Rolidei
(Foto: Beth Soares)
Mariana interpretava a personagem Serena Bartira, que vestia uma boia de patinho. O nome vinha da personagem interpretada por Priscila Fantin na telenovela. O sobrenome, da famosa índia dos tempos de Martim Afonso, em São Vicente. 

Homens feios – Hoje, Mariana só encarna personagens masculinos. “Gosto de fazer quem não sou.” Seus personagens ganham voz grossa, trejeitos embrutecidos e são carregados na maquiagem. Para Mariana, eles precisam ser feios. “O legal é o bizarro.”

Antes de ser atriz e trabalhar no Café Rolidei, Mariana Salgado teve trabalhos distintos. Vendeu sorvetes, animou festas e distribuiu “santinhos” de políticos em campanha eleitoral. De um deles, recita o jingle com se estivesse em dia de eleição: “Marcelo Bueno é nosso amigo presente em todos os tempos. Marcelo Bueno, 14 mil e 500.” A cada vez que escuta o texto,
Renato di Renzo dá risada e balança a cabeça.

Mariana Salgado sofreu, na infância, com os tiques nervosos. Ansiosa, piscava demais e o rosto se contraia. Como consequência, era motivo de risadas na escola. “Uma vizinha chegou a dizer que me penduraria na árvore de Natal.”

Segundo ela, o teatro foi o melhor remédio contra a ansiedade e os tiques nervosos. Em cena, tudo passa. Pelo
Tam Tam, ela conheceu diversos lugares pelo país, como Brasília, e no exterior, como Portugal, Argentina e Uruguai.

Em 2013, Mariana Salgado viajou com a mãe ao Rio de Janeiro. Visitou o bairro de São Conrado, onde fica a casa da atriz Adriana Esteves. Contentou-se em passar na frente da residência, em silêncio.

Antes de viajar ao Rio, ela havia escrito uma segunda carta para a atriz carioca, exatamente dez anos depois. Mais uma vez, não a enviou. “Ainda não é a hora de eu vê-la.”

Comentários

tania cesar disse…
Amo voce desde o primeiro momento em que te vi sentada e espevitada na porta do Rolidei.
Orgulho de poder dizer que sou sua amiga e fã incondicional....
Unknown disse…
Mariana é um talento absurdo, além de ser uma pessoa fantástica !!!! tem uma alegria fora do normal. Sou grande fã do trabalho que ela faz, tanto em suas apresentações, como também na dedicação com a Tam Tam.
Sueli Calvet disse…
*Muita emoção ao ler o texto do querido Marcus Vinicius, dedicado a essa menina-flor, linda por fora e por dentro, atriz talentosa, competente, que ADORO ver em cena. Parabéns Mari... por sua sensibilidade. Agradeço Marcus... mais uma vez... por esses passeios deliciosos por caminhos e pessoas da cidade. Sueli Calvet.