Os coronéis caiçaras



Os coronéis ocupam as páginas da história do Brasil desde a sala de parto, no século XVI. É claro que tiveram outros nomes, como fidalgos e senhores de engenho. Mais do que possuir uma patente militar, ser coronel significa se embebedar no poder, muitas vezes sem limites.

O coronel se consolidou como símbolo da cultura brasileira a partir do olhar sobre o mundo rural, principalmente na região Nordeste. O coronel não seria somente uma liderança política, mas um déspota dos trópicos, acima da lei, o quarto (ou único) poder capaz de legislar, executar e julgar sobre quaisquer comportamentos dentro de seu domínio.

Os coronéis nascem ou constroem sobrenomes tradicionais, um guarda-chuva que protege toda uma árvore genealógica de manutenção autoritária. Familiares e parentes são os multiplicadores do poder coronelista, sempre bem posicionados em todos os setores da política, escolhidos por voto de cabresto, por voto voluntário ou por indicação mesmo.

A Baixada Santista produziu sua versão de coronelismo. Até porque hoje soa brega andar a cavalo, de chicote na mão e chapéu na cabeça. José Sarney e Jader Barbalho, por exemplo, já largaram a fantasia há muitos carnavais.

A versão caiçara do coronelismo é pós-moderna. Os coronéis se vestem bem, usam ternos de griffe, comem em restaurantes com pratos que custam um salário mínimo, viajam de avião fretado. Quando não o fazem, transitam em carros ou motos importadas. A imagem de esportista é fundamental para construir a pose de saudável, descontraído e outros adjetivos sinônimos.

Como a aparência representa uma das chaves do negócio, os coronéis caiçaras são eficientes em esconder as máscaras. No fundo, repetem as práticas dos tradicionais mestres do século passado. Uma das máscaras é não demonstrar desejo de abocanhar todo o bolo. Fatias – também conhecidas como cargos, inclusive eletivos - são distribuídas em meio a sorrisos, alianças de ocasião ou acordos com outros poderes.

Os coronéis de cavalos de ferro importados e passeios em Miami se esforçam, mas não ocultam a dependência química pelo poder. Se não podem ocupá-lo oficialmente, fabricam o sucessor. Se não for de mesmo sobrenome, que esteja no círculo de amizades. Lealdade é qualidade bem recompensada.

Na Baixada Santista, os coronéis delimitam, com harmonia, os territórios. Em eleições nacionais, disputam – sem assumir publicamente – o mesmo espaço.

Os coronéis pós-ditadura militar exercem liderança desde a década de 90. E se aproveitam da ilusão do provincianismo, marcado pela infantilidade de quem se considera progressista. Trata-se de um argumento insustentável diante da inércia política no Poder Executivo. Os sintomas se manifestam pelo revezamento de cargos ou pela simples perpetuação de uma dinastia familiar.

Santos, São Vicente e Praia Grande são exemplos de cidades que se curvaram aos mesmos grupos no comando político. Os discursos de progresso são idênticos; mudam as cores das camisas dos partidos. Cubatão e Guarujá fingem ser exceções. O primeiro viveu um revezamento entre dois prefeitos durante 16 anos. Quebrou as algemas, mas sente o cheiro de retorno, em cor vermelha, com a multiplicação de partidos sanguessugas em volta.

Guarujá engana os apressados, mas o noticiário policial não deixa mentir, com ex-prefeito preso e outros políticos assassinados. O faroeste também tem cenas em Cubatão, onde desavenças são resolvidas na bala.

Se os coronéis existem, é porque seus súditos os apoiam ou se mostram omissos. Em outubro, os eleitores têm dois caminhos: romper a porteira ou se comportar como ovelhas na busca por um pastor.

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