Mulheres à esquerda


A decisão de Cassandra Maroni em não concorrer a outro mandato para vereadora sinaliza mais do que o sonho dela em se tornar prefeita de Santos. A aposentadoria legislativa da principal vereadora de oposição na cidade simboliza como a política ainda é uma atividade masculina por excelência.

Cassandra é hoje a única representante feminina na Câmara Municipal. E a presença das mulheres, a partir do próximo ano, dependerá quase exclusivamente da vontade das veteranas Maria Lúcia Prandi e Mariângela Duarte em concorrer, assim como fez Telma de Souza na última eleição.

A preocupação é consistente, inclusive por bases históricas. Nenhum partido conseguiu até hoje atingir a cota de 30% de mulheres na lista total de candidatos. A média oscila entre 15 e 18%. Com mandatos, as mulheres representam – historicamente – 10% das bancadas.

Neste sentido, olhar para a presença feminina no Poder Executivo – principalmente na Presidência da República – é um ato de covardia. É iludir os tolos ao transformar o raro em corriqueiro. Unir Dilma Roussef com Angela Merkel, da Alemanha, e Cristina Kichner, da Argentina, seria fingir um fenômeno global que mascara particularidades, contextos específicos.

A presença feminina na política brasileira e na política regional se assemelha ao menos em um ponto. As mulheres se destacam dentro das siglas mais alinhadas à esquerda. Elas estão ou passaram por partidos que tiveram - em algum momento – uma linha ideológica com afinidades socialistas.

Muitos destes partidos – inclusive o PT – aderiram ao pragmatismo de centro, postura comprovável pelas atitudes de governo como também pela afinidade com programas de adversários ditos mais conservadores.

Dilma Rousseff participou da luta armada e começou na política partidária do PDT brizolista, antes de se filiar ao PT. Marina Silva foi a grande surpresa na última campanha, com 20 milhões de votos. Marina estava filiada ao PV, que a abrigou na ocasião após saída conturbada do PT. Na eleição presidencial quatro anos antes, a pedra no sapato foi Heloisa Helena, do PSOL, que nasceu como dissidência petista.

Na Baixada Santista, Telma de Souza, Maria Lúcia Prandi e Mariângela Duarte ocupam ou ocuparam cadeiras na Assembleia Legislativa e na Câmara Federal, até no mesmo mandato. As duas primeiras permanecem no PT. Mariângela migrou para o PSB, mas permanece coerente com o passado quando se manifesta publicamente. Entre as três prefeitas na região, duas tem ligações históricas com o PT. Marcia Rosa, de Cubatão, ainda está no partido. Maria Antonieta de Brito, de Guarujá, é filiada ao PMDB, mas passou anos entre os quadros da sigla de Lula.

Na última eleição para a Prefeitura de Santos, eram três mulheres entre os cinco candidatos. Além de Mariângela e Maria Lúcia, Eneida Khoury (PSOL) concorreu ao Poder Executivo. Ex-vereadoras como Sueli Maia, Luzia Neófiti (já falecida) e Sueli Morgado também surgiram do mesmo endereço.

A desistência de Cassandra tem que fomentar a necessidade de renovação na esquerda, embora a mudança esteja condicionada em parte ao desejo político de Maria Lúcia e Mariângela. O fato é que as mulheres não promoveram a revolução feminina na política, mundo controlado pelos homens.

As mulheres são artigo raro, por exemplo, entre os tucanos. Nos partidos à direita e até entre os nanicos, mulheres são sinônimo de silêncio político, salvo exceções que nem cutucam a superfície do problema. Se as próprias representantes atuais são figurinhas carimbadas, a perspectiva indica que outubro será outra vitória por goleada dos ternos e das gravatas.

Comentários