Nas
duas vezes em que liguei a TV esta semana, eles estavam lá. Ambos se vestiam
bem, falavam com clareza e não suavam, mesmo que estivessem no meio de uma
tempestade. Aposto que estavam perfumados. Se a TV exalasse cheiro, o aroma
ocuparia a sala toda.
Com
falsa modéstia, diziam ao entrevistador que não se consideravam gurus. Minimizam
o que garante a própria existência: o acúmulo de dinheiro. No espelho, se veem
como sujeitos com boas ideias, dispostos a compartilhá-las com outras pessoas
que buscam qualidade de vida. Ou seria sucesso? Mudança de personalidade? Motivá-las
a protagonizar a própria vida? Torná-las proativas?
Os
clichês se amontoam para compor as receitas que servem como efeito colateral de
uma sociedade doente. Neste corpo enfermo, circulam imediatismo, fidelidade
cega ao consumo, individualismo, culto à aparência e outros microorganismos
semelhantes.
Em
um olhar microscópico, os gurus se revelam ocos. Como os caixeiros viajantes do
século 19, eles vendem receitas infalíveis para um público desesperado por
respostas milagrosas. Oferecem elixires exóticos que funcionarão como placebo para
males específicos.
Os
gurus do século 21 se fantasiam de profetas. A falsa sabedoria se esconde atrás
de respostas passo a passo, impregnadas de superficialidade. Profetas respiram
metáforas. Jamais indicam o caminho único.
Os
gurus trocam o cajado e as roupas maltrapilhas por palco, microfone, terno e
gravata, enquanto exigem fé incondicional. Sem ela, o fiel consumidor não
chegará ao paraíso ou permanecerá paralisado no purgatório do mercado, esteja
em igrejas ou em templos onde imperam reuniões, crachás e outros elementos, que
se valorizam quando ganham nomes em inglês.
Os
gurus também fingem agir como curandeiros para os males da vida profissional.
Como pajés artificiais, prometem a virada de mesa na próxima esquina ou na
semana que vem.
Pajés
ou xamãs sabem que o processo de cura é lento e depende do interior do
paciente. Pajés vêem com clareza a incerteza da cura. Às vezes, basta o
conforto de reduzir a dor. A sabedoria destes homens reside na convicção de que
o saber nunca é finito ou absorvido totalmente. O aprendizado é interminável e,
acima de tudo, indeterminado. Os gurus da modernidade, ao contrário, transpiram
convicção absoluta e conhecimento de causa, com respostas que se encaixam em
todas as dúvidas.
Os
gurus são filhotes do espetáculo. Motivam para entreter. Divertem para motivar.
Das palavras articuladas aos gestos calculados, caminham sobre o padrão, com
controle cirúrgico sobre a fé alheia. Prometem a felicidade e a mudança de
destino, embora conscientes de que virar a página depende do dono do livro, e
não de quem o vendeu.
Por
ironia, ao vê-los na TV, fiquei motivado. Pensei sobre eles. Enquanto escrevia,
os gurus vendiam livros de auto-ajuda. As obras davam dicas para enriquecer,
com a certeza de que ricos ficarão apenas os autores. Confesso que, por um
instante, eles quase me convenceram com as pregações. Para me proteger, me
agarrei ao meu próprio guru, o controle remoto.
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