Universidade de goleiros

O Palmeiras é um time chato de se ver. E dá prazer em assisti-lo jogar. As partidas se arrastam, com excesso de chutões e passes laterais. Faltam jogadores diferenciados. A correria o coloca no patamar dos comuns. Mas não perco um jogo da equipe.

Acompanho o Palmeiras para admirar a escola de goleiros do clube. A fabricação em série torna difícil diferenciá-los. O desempenho de Deola no último final de semana, contra o São Caetano, só surpreendeu os alienígenas. Excelentes goleiros brotam no gramado no Parque Antártica.

O goleiro Marcos é o maior ídolo do clube nos últimos 15 anos e, como disse recentemente, cumpre hora extra. Ele é o produto exclusivo de uma linha que permanecerá por anos no mercado sem risco de queixas nos órgãos de defesa do consumidor. Marcos pretende se aposentar no final da temporada, com a sucessão encaminhada. Ninguém precisa arriscar o nome. Seria mais confortável jogar as fichas numa lista de herdeiros.

O clube é o pior ataque dos quatro grandes no Campeonato Paulista, mas tem a melhor defesa. Sofreu somente seis gols em 14 partidas. E utilizou três goleiros diferentes. Bruno atuou uma vez, além de Deola e Marcos.

Quem acompanha futebol sabe que a diferença entre eles, na atualidade, não é tão grande a ponto de causar preocupação. Se um dos outros grandes tiver que escalar o reserva, haverá apreensão dentro e fora do campo. Temas como insegurança e irregularidade vão permear o noticiário. 


 O Palmeiras colhe os frutos da dinastia criada por Valdir Joaquim de Moraes, também um excelente goleiro, que se transformou em um dos maiores treinadores de camisas 1. Um dos três melhores goleiros brasileiros de toda a história fez carreira no Palestra. Emerson Leão jogou mais de 10 anos no clube e disputou quatro Copas do Mundo, duas como titular. Em três delas, defendia o gol palmeirense.

A partir dos anos 80, o Palmeiras estabeleceu sua escola, que casou com uma mudança de olhar do mercado internacional para os goleiros brasileiros. Entre Leão e Zetti, houve uma fase de transição, com dois bons profissionais: Gilmar e Martorelli. Não eram atletas de seleção brasileira, mas agüentavam as pontas em tempos de seca de títulos.

Com a chegada de Zetti, a linha de produção entrou em funcionamento. Depois dele, vieram Ivan Izzo e Veloso. O segundo alcançou a seleção. Veloso deu lugar a Marcos, que conviveu com Diego Cavalieri, excelente goleiro e vítima de escolhas erradas para um cargo de muitos candidatos e poucas vagas. No lugar de Cavalieri, Bruno e Deola que, aos 27 anos, assume um lugar de destaque no clube.

Deola rodou por equipes pequenas como Juventus, gastou as luvas e voltou mais maduro. Tanto ele quanto Bruno estão prontos para suceder o pentacampeão, de maneira definitiva, a partir do próximo ano.

O sucesso do Palmeiras na posição se deve ao método de trabalho, planejamento e, principalmente, ao entendimento dos goleiros de que devem se preparar sempre. No Palmeiras, goleiro precisa cultivar a virtude da paciência. Serão anos de banco de reservas até que apareça a chance, que não avisa quando cairá nas mãos deles. 


 Normalmente, um goleiro palmeirense nasce quando o outro se machuca. O parto sempre ocorre de surpresa. Veloso teve oportunidades com as contusões de Zetti e Ivan. Cavalieri aproveitou as graves contusões que torturaram Marcos após a Copa de 2002. Deola era terceiro goleiro e inverteu a hierarquia com Bruno quando ele se contundiu.

A escola palmeirense ganha maior evidência diante da dificuldade dos adversários em formar novos profissionais. O São Paulo vivencia a “ditadura” Ceni e seus quase mil jogos. Sorte do tricolor. O problema é que não há um novo Ceni à vista. O clube não formou novos goleiros nos últimos anos. Denis, que veio da Ponte Preta, é a aposta. Como toda aposta, pode dar errado.

O Corinthians não tem um ídolo da casa na posição desde Ronaldo. Depois dele, investiu em nomes de fora, alguns com sucesso como Dida e Felipe, que segurou à unha todas as vacas magras da Segunda Divisão. Julio César cresce com a titularidade, mas depende de rodagem para sabermos se a camisa se encaixa. O time não possui um reserva à altura.

O Santos é um caso à parte. O time da Vila Belmiro sempre teve grandes goleiros, muitos geniais, como Gilmar e Rodolfo Rodriguez, mas sempre contratados. O último a chegar à seleção brasileira foi Fabio Costa, importado da Bahia. Sergio (hoje Guedes) foi revelado pela Ponte Preta e foi à seleção nos anos 90, na época de elencos sofríveis e ausência de taças na estante. Nem o filho de Pelé, Edinho, saiu das categorias de base da Vila. 


Nas duas últimas temporadas, o Santos deu espaço para as revelações caseiras, mais por necessidade do que por vontade de romper a tradição. Felipe não suportou o tranco e perdeu a vaga para Rafael. O goleiro atual ainda provoca desconfiança até pela irregularidade natural entre os jovens.

Na Vila Belmiro, o goleiro Guido, das categorias de base, é tratado como uma revelação. Seria um líder nato – premissa da posição – e teria a característica de crescer em partidas importantes – premissa da posição em times grandes.

Nenhum dos três adversários do Palmeiras é capaz de incomodá-lo quando se discute goleiros. Seria a água do clube? Ou alguma substância adesiva nas luvas? É treinamento duro, oportunidade sem pressa e orientação adequada. A longo prazo.
No Parque Antártica, até o jeito de cair e reclamar com a defesa quando se toma gol é igual.

Comentários

Cahe´s blog disse…
É verdade. Com o Joaquim de Morais (i), um cara que nasceu para treinar goleiros o Palmeiras fez os maiores. Pena que ele se transferiu para o Corinthians - péssima escolha, ma o bom filho à casa torna.
Ele era o goleiro do Palmeiras seleção quando o alviverde representou com brilho o Brasil, ganhando do Uruguai por 3 X 0 na inauguração do Mineirão.
Como palmeirense, sempre me orgulhei dos goleiros, não poderia ser diferente, e cito dois exemplos:
1) 1978 - o garoto Leir Gilmar da Costa entra em campo no jogo decisivo contra o Guarani, substituindo Leão. Fecha a meta e só toma um gol por culpa de Beto Fuscão.
2) São Marcos tem o respeito até dos adversários: na Vila Belmiro, Marcão foi bater uma falta ao lado da torcida do Santos - silêncio e olhares e respeito (e se fosse o Ceni?).
Só pisamos na bola uma vez - quando foi contratado o Carlos da Ponte Preta (até hoje não se por quê).

Boa caro professor, meu time merece. Pena que hoje temos um técnico retranqueiro (no passado já mostrara isso e agora repete).
Abraço,
Carlos Freire
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