A falta de ambiente

A ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, cansou, desistiu depois de padecer a olhos vistos. O processo de fritura dela foi um dos momentos simbólicos do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Retrata, com exatidão, como as relações políticas são conduzidas em ares de banho-maria, à base de alianças duvidosas, em um clima de aperta-mão generalizado. Neste quadro, a equipe econômica recebeu carta branca para prender e soltar nos arredores do Palácio do Planalto. E colocou Marina na lona, numa sucessão de golpes, que somados, a nocautearam.

Marina Silva sucumbiu aos mecanismos de pressão de grupos políticos e econômicos que transitam com liberdade nos gabinetes de Brasília. Respeitada por ambientalistas e adversários fora do poder, Marina Silva chegou à exaustão ao perceber que o Governo Federal realmente está obcecado em acelerar obras e projetos que serviriam de legado para a atual gestão. É a demonstração da falta de planejamento, da ausência de um projeto para o país. Planejamento que deveria ser inerente em quaisquer obras de infra-estrutura, ainda mais da magnitude da transposição do rio São Francisco, por exemplo.

Este projeto nasce e se desenvolve de forma estranha. Não se trata da primeira tentativa. Durante o governo Fernando Henrique Cardoso, o Banco Mundial apresentou um relatório que condenava a obra. Beneficiaria poucas comunidades em relação ao tamanho do gasto. Se o Banco Mundial, representante máximo dos olhares dos países desenvolvidos, condenou a idéia, é de se desconfiar da necessidade nervosa do Governo Federal em tocar a proposta.

Marina Silva caiu de pé, como disse Frei Betto – outro que abandonou o barco ao vivenciar a mudança de rota. Não se apegou às amarras perversas do poder, ou seja, não abriu mão do que acredita em prol de dividendos fornecidos pelo cargo que ocupava. Ela é respeitada por conhecer a Amazônia a fundo e por entender sua importância política, social e econômica em escala global. O sintoma disso foi a repercussão acentuada na imprensa internacional e entre líderes políticos de outros países.

Na verdade, a saída da ministra do Meio Ambiente indica como os governos – em todas as esferas no Brasil – insistem em encarar a sustentabilidade como um entrave para o “desenvolvimento econômico”. O discurso de preservação ambiental é lindo. Todos se apóiam nele. Basta observar os desenhos das plataformas de campanha eleitoral.

Na prática, a área recebe recursos diminutos e poderes limitados. É vista como um mal necessário para a composição de uma imagem diante de uma sociedade que também faz jogo-de-cena com as questões ambientais. O meio ambiente se transforma realmente em preocupação quando os problemas batem à nossa porta.

Não é à toa que a chanceler Ângela Merkel esteve no Brasil para negociar com o presidente Lula. Na cabeça da pauta, o bio-combustível. O etanol que tanto incomoda a matriz energética vigente e que segue envolto em uma aura de falta de informação e de planejamento. Se o assunto é tão importante assim, que o Ministério do Meio Ambiente se sente à mesa de negociações. Viu-se o contrário!

Quanto ao novo ocupante da pasta, Carlos Minc, o clima é naturalmente de desconfiança. Espera-se dele, ao menos, que saia do caminho no sentido de aprovar os projetos necessários para o chamado “progresso”. No fundo, o cenário permanece em compasso de espera diante do que fará o ministro Mangabeira Unger, visto por muitos como a eminência parda deste governo.
Se a lógica dos fatos ocorridos na última semana for mantida, ruralistas (representados por um terço dos parlamentares federais), construtores e industriais do cimento podem ligar as moto-serras. Pelo ritmo de devastação na Amazônia, os equipamentos já se encontram em ponto de ebulição para sufocar uma região tão cobiçada, tão desejada.

Comentários

Grata pelo comentário!
Você simplesmente, resumiu em uma frase todo a idéia do meu texto!
Pois então, parece que quanto mais o tempo passa mais retrocedemos, mas ainda existem pessoas coerentes.

Abraço