A cor da escola

Desde que o homem definiu a propriedade privada, construiu um muro – literal ou simbólico - para assegurar a praticidade deste conceito. Muro que serve como mecanismo de segurança e, do outro lado da moeda, para afastar indesejáveis.

O muro pode gerar visões múltiplas. Para o ladrão, um obstáculo a ser superado. O dono da área o vê como proteção. A criança o utiliza como fonte de imaginação. O que se esconde do outro lado?

O bêbado se socorre no banheiro de última hora. O pichador o enxerga como símbolo de transgressão. O pintor lamenta o tamanho da tarefa obrigatória. O grafiteiro está diante de uma tela a céu aberto.

E quando o muro funciona como o encastelamento do saber, simbolizado equivocadamente em uma instituição escolar? Em países como a Suécia, as escolas não possuem paredes que as separem as ruas. Isso representaria privar a comunidade do convívio com a unidade de ensino, além de significar o oposto da visão de educação como ação pública.

No Brasil, mais do que muros, as escolas têm grades, guardas, câmeras e cadeados. Só não se sabe se é para manter os invasores afastados ou se é para manter encarcerados os alunos. No fundo, no fundo, os dois!!!

A sensação é que os muros das escolas apresentam grau de parentesco com as paredes que delimitam os presídios. São parecidos fisicamente. Possuem mesmo tom acinzentado, semi-morto. Trata-se da cor da pele de quem os freqüenta? Ou a tonalidade de perspectiva de mundo de quem teve a idéia de pintá-lo?

Em muitas cidades, os muros são usados como imagem e semelhança de seus governantes. Gastam-se litros de tinta para dar uma nova cara – mas a falta de vida permanece – às escolas a cada quatro anos, como se fossem propriedade de uma facção ou grupo que gerencia o município ou o Estado.

Em Santos, por exemplo, há escolas cercadas por barreiras de cores cinza, azul bem claro insosso ou laranja. Aparece também o bege neutro e vazio. Depende do gosto do gestor. O irônico é que todos pregam de forma fervorosa a aproximação do espaço escolar com a comunidade. Falam em tom de indignação que as escolas precisam se conectar à realidade do mundo, às artes, ao conhecimento. Infelizmente, são incapazes de olhar para o próprio umbigo. Ou melhor, para fora da janela de seus respectivos gabinetes.

A escola é vida! Está repleta de vidas que apostam anos numa mudança radical ou na realização de sonhos. Um muro sem vida é o cartão de visita do que estudantes, pais e funcionários viverão no cotidiano. As paredes em volta da escola poderiam ser o pontapé de mudança. Por que não envolver a todos e transformar as barreiras do castelo em ponto de arte pulsante? Envolver grafiteiros e outros artistas entre o grupo social escolar para amenizar as grades, câmeras e cadeados?

Este texto me fez lembrar de um caso ocorrido no começo desta década, em Praia Grande. O delegado do 1º Distrito Policial resolveu pintar a fachada do local com flores e outros desenhos em cores fortes. O argumento dele é que a pintura tornaria a ida de uma pessoa à delegacia – normalmente difícil - menos angustiante. É óbvio que o assunto virou notícia. O resultado foi que o comando da Polícia mandou murchar (apagar) as flores. Afinal, quem disse que delegacia pode se tornar um lugar alegre? A fachada deve ser cinzenta, para combinar com a escola e seguir a padronização burocrática.

Comentários

Leandro Olimpio disse…
Muito bom o comentário professor!
Como já havia comentado anteriormente. Só tenho uma observação a fazer. Peça para o Gil ou outra pessoa fazer um layout para o seu blog. Ficará bem melhor!...rs

Abraço!!
Este comentário foi removido pelo autor.
Ah Marcus!agora entendi por que você comentou sobre o layout do seu blog!Particularmente eu gosto, acho bem clear, sóbrio, é interessante!

Mais uma fabuloso artigo, o que você escreveu, eu vivenciei, a diretora de uma escola estadual de Mongaguá, resolveu que os alunos irião escolher a cor da escola e que poderiam fazer pinturas nas paredes externas da mesma, pois assim o fizeram, mas a diretoria de ensino não aprovou a decisão da diretora.

Abraços, até uma próxima!
Aguardo, novos artigos.
O Blog passará por mudanças de layout em breve. Aguardem!!!
Heidy, obrigado pelo comentário! Infelizmente, sempre há um burocrata no nosso caminho. Abraço.
Eduardo Henrique disse…
Eu tive uma boa experiência, embora o final tenha me decepcionado. Eu ajudava a editar um jornalzinho na escola que estudava. Era um tanto precário, feito no Word, impresso em A4 depois fazíamos cópias, que eram coladas em espaços cedidos nos corredores pintados de azul e cinza.
O jornal começou na minha sexta série e se estendeu até a oitava. Desde o primeiro dia, os editorias falavam sobre cor. Na realidade, queríamos fazer dos muros da escola um grande mosaico. A batalha foi “vencida” no meu último mês de aula. Conseguimos a nossa tela. Fizemos um ótimo trabalho, devo ainda ter alguma foto para comprovar.
Fiquei um bom tempo sem passar próximo da antiga escola, pois estava estudando em outra Cidade. Ao tira o título de eleitor, dois anos depois, coincidiu de meu colégio eleitoral ser a minha saudosa escola, local que iniciei meus primeiros textos.
A minha surpresa foi ver o velho muro caiado de volta à cor original. No interior percebi a mesma indiferença, desta vez sem os A4’s em quatro colunas do “Opinião Escolar” pendurados. Mas, o que mais me desapontou foi a quantidade de grades presas às janelas. Senti-me livre em uma cela.
Eduardo,

Obrigado pelo testemunho!!! A escola é feita por pessoas que, muitas vezes, a desejam sua imagem e semelhança. Exercitam o poder como diretores de uma carceragem. abraço!!